Tenho um
livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino que carregava água na peneira.
A mãe disse que carregar água na peneira era o mesmo que roubar um vento
e sair correndo com ele para mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo que catar espinhos na água
O mesmo que criar peixes no bolso.
Estamos envelhecendo,
estamos envelhecendo, estamos envelhecendo, só ouço isto. No táxi,
no trânsito, no banco, só me chamam de senhora. E as amigas falam
“estamos envelhecendo”, como quem diz “estamos apodrecendo”.
Não estou achando envelhecer esse horror todo. Até agora. Mas a
pressão é grande. Então, outro dia, divertidamente, fiz uma
analogia.
Palavras são
como estrelas
facas ou flores
elas têm raízes pétalas espinhos
são lisas ásperas leves ou densas
para acordá-las basta um sopro
em sua alma
e como pássaros
vão encontrar seu caminho.
Pessoas vão
embora de todas as formas: vão embora da nossa vida, do nosso coração, do nosso
abraço, da nossa amizade, da nossa admiração, do nosso país. E, muitas a quem
dedicamos um profundo amor, morrem. E continuam imortais dentro da gente. A
vida segue: doendo, rasgando, enchendo de saudade... Depois nos dá aceitação,
ameniza a falta trazendo apenas a lembrança que não machuca mais: uma frase
engraçada, uma filosofia de vida, um jeito tão característico, aquela
peculiaridade da pessoa.
Tem gente que tem cheiro
de passarinho quando canta. De sol quando acorda. De flor quando ri. Ao lado
delas a gente se sente sem relógio e sem agenda. Ao lado delas, a gente se
sente comendo pipoca na praça. Lambuzando o queixo de sorvete. O tempo é outro.
E a vida fica com a cara que ela tem de verdade, mas que a gente desaprende de
ver.
Tem gente que tem cheiro de cafuné sem pressa. Do brinquedo que a gente não
largava. De passeio no jardim. Ao lado delas, agente não acha que o amor é
possível, a gente tem certeza.
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