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Mostrando postagens com o rótulo Fernando Tenório

Um Amor (Emanuel Galvão)

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              Alguém já me havia dito que a vida é bem representada pelo aparelho que fica ao lado do leito dos pacientes, principalmente os da UTI. Aquele que faz um sobe-desce e determina o ritmo do coração, um gráfico para dizer a quantas anda nosso batimento cardíaco.  A vida tem seus altos e baixos, vejam, suas árduas subidas e os santos ajudando ladeira a baixo, como diz o ditado.            Naquele aparelho o que não se quer é uma linha reta, horizontal a sinalizar que descansamos. E na batalha da vida, pela vida e com a vida, os amores. Esses que também tem aclives e declives e podem ser difíceis para alguns, como estas palavras. Afinal, a vida não é para amadores. E eu direi: a vida é para amantes. Esses que de conversa em conversa, vão alimentado de saudades um relacionamento, esses temperados com sorrisos, carinhos e gentilezas.            São esses amores silenciosos, com menos boca e mais ouvidos que conquistam a eternidade. Saber ouvir é uma arte, saber ouvir e sorrir  é

Problema de Casal (Fernando Tenório)

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Estava de plantão num hospital psiquiátrico. A noite navegava entre um atendimento e outro, permitindo cochilos nos intervalos entre as consultas. Três e meia da manhã, e ouvi um companheiro de trabalho avisar: - Chegaram dois pacientes. - De ambulância? - Nada. Vieram juntos. A cena era inusitada. O homem com uma gravata, camisa mal passada, calça de linho. A mulher com um vestido de festa cheio de brilho e sandália alta. Ambos claramente alcoolizados. Chamei o camarada, mas a moça logo pediu uma "consulta conjunta" e também entrou na sala. Perguntei-lhes: - O que trouxe vocês aqui? Eles se entreolharam, e a mulher resolveu tomar partido: - Resolvemos vir aqui saber quem é o mais doido da relação. - Isso! Estávamos voltando de um baile de formatura e ela teimou que sou estranho, mas na verdade a maluca é ela. Então, resolvemos passar aqui para ouvir a opinião de quem entende - disse o marido. Eu já estava acordado, mas nem tanto. Ainda assim, deixei a curiosidade conduzir

A Verdadeira Cura (Fernando Tenório)

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Sábado de plantão. Depois de alguns atendimentos domiciliares, a ambulância ruma pela cidade. Os contrastes do Rio de Janeiro sendo vistos pela janela. Tentava absorver a cidade com os olhos, vendo meninos jogando futebol, mulheres conversando fortuitamente nas cadeiras da calçada e pude ver no Irajá uma pichação da cigana Oleska: “Trago o amor em 7 dias. Se não trouxer não era amor”. De alguma maneira, aquele recado escrito no muro enegrecido mexeu com todos ali. Luiz, o motorista, sorriu. André, o enfermeiro, cuidou em tirar foto para mandar à namorada. Eu fiquei pensando na verdade da sentença. Chegamos a Madureira, destino do atendimento domiciliar. Terra do samba, das mulatas que requebram até de manhã, da Portela e Império Serrano. Isso pouco importava. O rádio já havia confirmado que um senhor 88 anos estava em franca dispneia. Entramos numa vila de casas pequeninas e na residência de cor amarela avançamos. O sofá era o abrigo para o senhor. Ele estava sentado, com a

As Melhores Pessoas (Fernando Tenório)

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Duas mulheres entram numa das maiores confeitarias de Maceió. A beleza da loira era estonteante. O pedaço de bolo logo foi esquecido e os olhos ficaram devotados somente para ela. A outra mulher, de cabelos brancos e colar dourado, perguntou: - E namorado, minha filha? Você está quase há um ano solteira. Mulher bonita troca de namorado, mas não fica solteira. - Vovó, a fase não está boa mesmo. Estou andando nas melhores festas, naquelas das melhores pessoas. Festa só vale a pena se o ingresso custar acima de duzentos reais. O encanto foi sepultado com apenas poucas palavras. Terminei meu bolo rapidamente e voltei para casa pensando nas “melhores pessoas” e o que elas fazem. As melhores pessoas ajeitam seus ventiladores na calçada, andam com pouca roupa pela rua e cuidam das plantas ao final do dia. Quando andam na praia, elas não olham com inveja para os prédios luxuosos e palacetes alheios, preferindo agradecer pela leve brisa que acalenta. As melhores pe

O Que é Morrer de Sede em Frente ao Mar? (Fernando Tenório)

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Carlos saiu para passear. Embora avesso às saídas no fim de tarde de sábado resolveu, por obra do destino ou acaso, ver o mar. Experimentou a brisa no rosto como há muito não fazia. Olhou para o azul do céu e lembrou-se dos olhos de um passado que ainda mexe. Mexe mais que ressaca de mar revolto, tem poder maior que o da água na arrebentação, a qual pode,apesar da sua fluidez, levar tudo consigo.

Onde anda seu primeiro amor? (Fernando Tenório)

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Todos nós já tivemos um primeiro amor. Pode não ter sido o melhor beijo, o melhor na cama e o amor mais intenso. No entanto, guardamos no bolso que carregamos o passado um quê de nostalgia e uma curiosidade sobre a vida do amor mais pueril. Certo dia lembrei do meu primeiro amor. A moça era de Maribondo-Alagoas, assim como eu. Por ela fui capaz de ir contra minha natureza. Frequentei as discotecas das cidades vizinhas. Thundercats em Capela, Zueira em Anadia e Miau em Tanque D´arca. Frequentei muito show de forró para ter chance de chamá-la à uma única dança. Por ser um péssimo dançarino, concentrava-me em não pisar em seu pé e não proferia uma só palavra. Mesmo assim, ganhava a noite por minha coragem e quase conquista.