O Beijo (Elsa Moreno)

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O Beijo de Gustav Klint (fragmento) Eu acho que os beijos são dados na boca porque é onde brotam as palavras. Se eu te beijasses a ponta dos dedos, estaria buscando uma carícia; se te beijasse a sola do sapato, estaria buscando um caminho. Se te beijasse as pálpebras enquanto dormes, estaria pedindo permissão para entrar nos teus sonhos, mas estou te beijando os lábios, porque quero ouvir minhas palavras saírem de ti, outra vez. Se te beijasse a planta dos pés, buscaria um passo em falso. Se te beijasse a parte interna do cotovelo, buscaria teus esconderijos. Se te beijasse a sombra, não saberia o que busco, mas estaria tão perto. Se te buscasse essa noite, beijaria cada estranho até te encontrar. Outra vez. Se eu te beijasse, seria como algo escorregadio sobre uma tela de carne que transborda e se espalha pelas vigas da minha casa. Subiria escorregadia por um muro, separando a pele da carne que se injeta em uma estrutura impessoal chamada nome. Estaria consumida antes mesmo de abrir ...

MEU CHÃO: NORDESTE (Emanuel Galvão)



Tanto mais me aproximo do meu chão
Mais escuto no ar uma canção
Como hino trazido pelo vento
Que me faz lembrar todo momento
O torrão ardente que me deste
A brisa que sopra em meu nordeste.

Tanto mais me aproximo do meu chão
Mais me pego a fazer uma oração
Pra que nunca me esqueça dessa raiz
Que apesar de desprezado no país
Tem cultura bela e inconteste
Essa gente que habita o meu nordeste.

Tanto mais me aproximo do meu chão
Mais me arde no peito uma paixão
Um amor tão quente quanto o sol
Colorindo o céu num arrebol
Descansando seu brilho no oeste
Vai se pondo o sol do meu nordeste.

Tanto mais me aproximo do meu chão
Mais me dói essa perversa agressão
De que somos um povo ignorante
Que balança a cabeça a todo instante
Se não nos conhece, não se preste
A escarnecer assim do meu nordeste.

Tanto mais me aproximo do meu chão
Gonzaga, Padre Cicero, Lampião
Patativa do Assaré, “o inteligente”
Representam bem mais a minha gente
Não carece de aprovação lá do sudeste
Tem orgulho dos seus o meu nordeste.

Tanto mais me aproximo do meu chão
Mais me perco na imensa amplidão
Da cultura que floresce em minha terra
Cultivando na dor a paz na guerra
Cantando com a força que nos reste
A riqueza musical do meu nordeste.

Tanto mais me aproximo do meu chão
Mais me junto aos demais na procissão
Dos que plantam com fé o seu destino
E se orgulha de ser tão nordestino
Que essa terra lhe parece até celeste
O paraíso que é o meu nordeste.

Tanto mais me aproximo do meu chão
Mais pelejo em andar na contramão
E protesto contra esse preconceito
De quem sem conhecer só vê defeito
Em um povo que é tão cabra da peste
Nordestino que idolatra o seu nordeste.

Tanto mais me aproximo do meu chão
Quando da hora que todos partirão
Envolvido na terra que me cobre
Partirei com o coração mais nobre
Orgulhoso da terra que me veste
Abraçado até o fim pelo nordeste.


Copyright © 2015 by Emanuel Galvão
All rights reserved. 

Do Livro Elogio ao Desejo & Outras Palavras



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