O Beijo (Elsa Moreno)

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O Beijo de Gustav Klint (fragmento) Eu acho que os beijos são dados na boca porque é onde brotam as palavras. Se eu te beijasses a ponta dos dedos, estaria buscando uma carícia; se te beijasse a sola do sapato, estaria buscando um caminho. Se te beijasse as pálpebras enquanto dormes, estaria pedindo permissão para entrar nos teus sonhos, mas estou te beijando os lábios, porque quero ouvir minhas palavras saírem de ti, outra vez. Se te beijasse a planta dos pés, buscaria um passo em falso. Se te beijasse a parte interna do cotovelo, buscaria teus esconderijos. Se te beijasse a sombra, não saberia o que busco, mas estaria tão perto. Se te buscasse essa noite, beijaria cada estranho até te encontrar. Outra vez. Se eu te beijasse, seria como algo escorregadio sobre uma tela de carne que transborda e se espalha pelas vigas da minha casa. Subiria escorregadia por um muro, separando a pele da carne que se injeta em uma estrutura impessoal chamada nome. Estaria consumida antes mesmo de abrir ...

Seu Rei Mandou Dizer... (Emanuel Galvão)


"...mas das palavras não sou eu que faço uso.
São elas, as geniosas, as venais que se utilizam
de mim e se divertem.."
Bruna Lombardi


Pensei certa vez:
Que ofício tem o poeta,
Senão brincar com as palavras?
Não percebia eu
Que elas - as palavras -
É que brincavam comigo.

Percebi isto quando,
Brincar não estava disposto
E as palavras brincavam de se esconder,
De escorregar, de pega-pega,
De pular carniça;
- cada brincadeira de mau gosto! -
De boca de forno,
Só pra me fazer ir e vir.
Atrás de letras, sílabas, pontos, vírgulas
Que seu rei mandou dizer...
E como não bastasse dizer!
Escrever, escrever, escrever...

Mas a palavra é como criança
Quer ser grande antes do tempo
Quer ser independente
- palavras dão um trabalhão
quando esperneiam cheias de vontades -
É feito filho que a gente cria
Sem saber pra quê
(antes, depois ou entre)
Palavra encanta a gente!
E dá a falsa esperança
Que através delas
A gente pode ser pra sempre.

Copyright © 2007 by Emanuel Galvão
All rights reserved.


Tela: Moleques Pulando Cela (1958) - Cândido Portinari

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