Invenção de Orfeu UM MONSTRO FLUI NESSE POEMA] (Jorge de Lima)

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Catástrofe ambiental provocada pela Braskem [ [UM MONSTRO FLUI NESSE POEMA] Um monstro flui nesse poema feito de úmido sal-gema. A abóbada estreita mana a loucura cotidiana. Pra me salvar da loucura como sal-gema. Eis a cura. O ar imenso amadurece, a água nasce, a pedra cresce. Mas desde quando esse rio corre no leito vazio? Vede que arrasta cabeças, frontes sumidas, espessas. E são minhas as medusas, cabeças de estranhas musas. Mas nem tristeza e alegria cindem a noite, do dia. Se vós não tendes sal-gema, não entreis nesse poema.           Invenção de Orfeu, Canto Quarto, poema I

A Reunião dos Bichos (Antônio Francisco)



Eu vinha de Canindé 
Com sono e muito cansado
Quando vi, perto da estrada
Um juazeiro copado.
Subi, armei minha rede,
Fiquei nele deitado.

Como a noite estava linda
Procurei ver o cruzeiro,
Mas cansado como estava
Peguei no sono ligeiro,
Só acordei com os gritos
Debaixo do juazeiro.

Quando olhei para baixo
Eu vi um porco falando,
Um cachorro e uma cobra
E um burro reclamando,
Um rato e um morcego
E uma vaca escutando.

O porco dizia assim:
-“Pelas barbas do capeta!
Se nós ficarmos parados
A coisa vai ficar preta...
Do jeito que o homem vai
Vai acabar o planeta.

Já sujaram os sete mares
Do Atlântico ao mar Egeu,
As florestas estão capengas,
Os rios da cor de breu
E ainda por cima dizem
Que o seboso sou eu.

Os bichos bateram palmas,
O porco deu com a mão,
O rato se levantou E disse:
– “Prestem atenção,
Eu também já não suporto
Ser chamado de ladrão.

O homem, sim, mente e rouba,
Vende a honra, compra o nome.
Nós só pegamos a sobra
Daquilo que ele come
E somente o necessário
Pra saciar nossa fome.”

Palmas, gritos e assovios
Ecoaram na floresta,
A vaca se levantou
E disse franzindo a testa:
– “Eu convivo com o homem,
Mas sei que ele não presta.

É um mal-agradecido,
Orgulhoso, inconsciente.
É doido e se faz de cego,
Não sente o que a gente sente,
E quando nasce é tomando
A pulso o leite da gente.

Entre aplausos e gritos,
A cobra se levantou,
Ficou na ponta do rabo
E disse: – “Também eu sou
Perseguida pelo homem
Pra todo canto que vou.

Pra vocês o homem é ruim,
Mas pra nós ele é cruel.
Mata a cobra, tira o couro,
Come a carne, estoura o fel,
Descarrega todo o ódio
Em cima da cascavel.

É certo, eu tenho veneno,
Mas nunca fiz um canhão
E entre mim e o homem,
Há uma contradição
O meu veneno é na presa
O dele é no coração.

Entre os venenos do homem,
O meu se perde na sobra...
Numa guerra o homem mata
Centenas numa manobra,
Inda tem cego que diz:
Eu tenho medo de cobra.”

A cobra ainda quis falar
Mas de repente um esturro
É que o rato pulando
Pisou no rabo do burro
E o burro partiu pra cima
Do rato pra dar-lhe um murro.

Mas, o morcego notando
Que ia acabar a paz,
Pulou na frente do burro
E disse: – “Calma, rapaz!...
Baixe a guarda, abra o casco,
Não faça o que o homem faz.”

O burro pediu desculpas
E disse muito obrigado,
Me perdoe seu morcego
É que eu ando estressado
De tanto apanhar do homem,
Sem nunca ter revidado.

O rato disse: - seu burro
Você sofre porque quer,
Tem força por quatro homens,
Da carroça é o chofer,
Sabe dá coice e morder,
Só apanha se quiser.

O burro disse: - Eu sei
Que sou melhor do que ele,
Mas, se eu morder o homem
Ou se der um coice nele
É mesmo que está trocando
O meu juízo no dele.

Os bichos bateram palmas
E gritaram muito bem,
O burro disse obrigado
Mas, aqui ainda tem
O cachorro e morcego
Que querem falar também.

O cachorro disse: - Amigos
Todos vocês todos tem razão,
O homem é um quase nada
Rodando na contramão,
Um quebra-cabeça humano
Sem prumo e sem direção.

“Eu nunca vou entender
Porque o homem é assim:
Se odeiam, fazem guerra
E tudo quanto é ruim
E a vacina da raiva
Em vez deles, dão em mim”.

Os bichos se levantaram
E gritaram vá em frente,
Mas, o cachorro parou
Disse: - Obrigado gente,
Mas, tem ainda o morcego
Pra dizer o que ele sente.

O morcego abriu as asas
Deu uma grande risada
E disse: - Eu sou o único
Que não pode dizer nada
Porque o homem pra nós
Tem sido até camarada.

Constrói castelos enormes
Com torres, sino e altar,
põe cerâmica e azulejos
E dão pra gente morar
E deixam milhares deles
Nas ruas sem ter um lar.

O morcego bateu asas,
Se perdeu na escuridão,
O rato pediu a vez,
Mas, não ouvi nada não,
Peguei no sono e perdi
O fim da reunião.

Quando o dia amanheceu,
Eu desci do meu poleiro,
Procurei os animais,
Não vi mais nem o roteiro,
Vi somente umas pegadas,
De baixo do juazeiro.

Eu disse olhando as pegadas:
Se essa reunião
Tivesse sido por nós,
Estava coberto o chão
De piubas de cigarros,
Guardanapo e papelão.

Botei a maca nas costas
E saí cortando o vento.
Tirei a viagem toda
Sem tirar do pensamento
Os sete bichos zombando
Do nosso comportamento.

Hoje, quando vejo na rua
Um rato morto no chão,
Um burro mulo piado,
Um homem com um facão
Agredindo a natureza,
Eu tenho plena certeza:
Os animais têm razão.


*Nossa solidariedade aos animais e
os povos da Amazônia, pelo descaso
do Governo Federal com as
questões ambientais.


Veja o vídeo! 



Comentários

  1. Olá!
    Sou escritor. Estou às vésperas de lançar novo livro na Praça. Gostei muito da poesia intitulada do poeta Antônio Francisco. Por isso gostaria de entrar em contato com ele pra saber se haveria possibilidade de formarmos uma parceria visando o lançamento desse livro.

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  2. Em tempo:
    A REUNIÃO DOS BICHOS.
    Autor: Antônio Francisco.

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